De David Hutchings
Às vezes, é bom lembrar que os cientistas também são pessoas. Aquele autor de um artigo de ponta sobre modelos do multiverso pode estar engatinhando por sua sala com seu filho de um ano, fingindo ser um tigre. Aquele professor que fala sobre mudanças climáticas no segmento de notícias pode passar o próximo sábado preso no trânsito, em pânico por perder o aniversário de um amigo. Aquele Prêmio Nobel abrindo uma nova ala hospitalar pode ter dificuldades consistentes em conseguir que seu abridor de latas funcione corretamente.
Compreender tudo isso pode ajudar a abrir um pouco nossos olhos para como a ciência real de fato acontece. Veja, por exemplo, estas duas possibilidades:
Hipótese Um: A ciência é um processo estável, racional e confiável, firmada em respostas certas com a precisão de um raio laser. Ela não é afetada por sentimentalismo, preconceitos ou ilusões, pois tem um método infalível que foi experimentado e testado ao longo dos séculos – e que não permite que o sentimento humano turve as águas. Como resultado, o progresso é suave e elegante, dando origem a tecnologias maravilhosas e belas verdades. A ciência nunca falha.
Hipótese Dois: A ciência é uma atividade realizada por seres humanos. Uma vez que os seres humanos são emocionais, muitas vezes preconceituosos, e particularmente inclinados a acreditar que estão certos, a ciência apresentará tudo isso, e muito mais. A ciência, como tantos outros empreendimentos humanos, pode realmente ser absolutamente gloriosa; mas também pode falhar – às vezes.
Como todos os cientistas sabem, as hipóteses são muito boas; mas elas se sustentam apenas até serem testadas de alguma forma. Qual destes dois pontos de vista da ciência, então, se sustentam melhor à luz das evidências? Talvez um estudo de caso possa ajudar.…
Em 1846, Ignaz Semmelweis ingressou no Hospital Geral de Viena, liderando o parto e os cuidados pós-natais. O que ele descobriu lá foi verdadeiramente chocante. A morte, ao que parece, não estava apenas no ar – estava nas próprias mãos dos médicos.
Reunindo estatísticas, Semmelweis descobriu que cerca de uma em cada dez mulheres tratadas pela equipe de alto nível morria de infecção. Isto foi quatro vezes mais elevado do que aquelas tratadas pelas parteiras (na subalterna “segunda clínica”) e vinte vezes mais do que no mesmo hospital 30 anos antes. Juntando os dados, Semmelweis criou uma teoria. Observando que os médicos haviam começado a fazer autópsias em 1823 e também que as parteiras nunca tinham tido contato com esses corpos, ele supôs que o material “morto” dos corpos era, em última análise, o culpado.
Seu modelo era simples, com uma solução simples. Uma vez que o problema era provavelmente causado por indivíduos que trabalham com cadáveres e, em seguida, iam direto para o tratamento de mulheres grávidas, ele introduziu a lavagem de mãos entre as atividades. Funcionou: apenas um ano depois, o número de mortos tinha caído para um décimo do seu valor anterior. Centenas de vidas foram salvas.
Até agora, esta história parece apoiar a Hipótese Um. A análise científica dura e fria revelou uma nova compreensão da natureza que, por sua vez, beneficiou a humanidade imensamente. No entanto, ainda não terminamos…
O trabalho de Semmelweis não era universalmente popular, pois alguns achavam que ele havia cometido uma grande gafe. O chefe destes era o Dr. Charles Meigs nos EUA, que ficou horrorizado com a sugestão de que os médicos poderiam ter as mãos sujas. Ele considerou uma acusação escandalosa e se opôs por princípio. Ele tinha influência, e outros profissionais de medicina logo se alinharam para questionar a ciência de Semmelweis. Desafiado a fornecer provas de que este material mortal realmente existia, e ainda a explicar o que ele era, Semmelweis não podia fazer nenhum dos dois – a teoria dos germes ainda estava a anos de distância, assim como o equipamento adequado. A maré, muito rapidamente, virou.
Apesar dos dados estarem do seu lado, Semmelweis foi ostracizado. A política de lavar as mãos foi abandonada, ele perdeu o emprego em Viena, e a frustração de não ser ouvido o levou a beber. Eventualmente, sua intempestividade contra seus oponentes – indo tão longe a ponto de chamá-los de assassinos por ignorá-lo – foi considerada como sendo a de um louco. Em 1865, sua própria família o levou à força para um asilo, onde uma surra que recebeu depois de protestar por sua inocência o levou à morte, sozinho, em uma cela.
Desprezando uma tradição honrada, os seus colegas médicos nada fizeram para reconhecer a sua morte. E, enquanto Semmelweis caía no esquecimento, as mulheres continuaram a ser tratadas por mãos contaminadas – morrendo aos milhares.
Parece que a Hipótese Dois pode ser mais realista do que se pensava. Nossa humanidade não desaparece magicamente só porque estamos fazendo ciência – não mais do que quando estamos engajados na política, na arte ou na literatura. Se um erro doloroso está apenas a um passo de distância, o que pode manter os cientistas motivados? Porque eles não deveriam simplesmente desistir?
A resposta – por menos científica que possa parecer à primeira vista – é: a esperança. Ao vestir um jaleco, sentar na frente de um computador ou iniciar um procedimento cirúrgico, o cientista revela um otimismo profundo: de que, eventualmente, resolveremos as coisas. Veja as palavras de Bonnie Bassler, bióloga molecular de Princeton:
“A ciência é árdua e lenta, não importa quem você seja.
As horas são longas, e os dias gloriosos de “aha!” vêm apenas com pouca frequência.
Você tem que continuar acreditando que, se você dedicar horas, esses dias realmente chegarão!
Parece que a ciência tem em seus fundamentos dois princípios centrais: em primeiro lugar, que as coisas não são como deveriam; em segundo lugar, que ainda há esperança realista para um futuro melhor. Sem uma dessas ideias, a ciência simplesmente se encurvaria – e morreria.
Dando um passo atrás, no entanto, notamos que nenhuma destas noções-chave realmente surgem de dentro do trabalho científico. A ciência como método é silenciosa sobre o que “deveria” ser – assim como sobre o que “melhor” significa. Os cientistas, portanto, têm de “pedir emprestado” a base, a motivação e até mesmo a justificação do seu trabalho de outros campos humanos – então onde melhor encontrá-los?
A fé cristã é um candidato possível: pois estes conceitos gêmeos tão vitais estão escritos em toda a sua narrativa. O estado atual das coisas, diz a Bíblia, não está correto; mas há esperança de futura restauração divina – e devemos começar a trabalhar para isso agora. Enquanto a humanidade se encontra em um estado quase constante de luta moral, física e mental, a Bíblia nos chama a buscar o melhor confiando e seguindo a Jesus, buscando a verdade e a restauração no presente. Em última análise, a Bíblia apresenta Jesus como sendo aquele que vai completar este trabalho, mas os cristãos não devem apenas se sentar de braços cruzados e esperar por ele; em vez disso, devem buscar seu perfeito propósito todos os dias.
Talvez o fato de que a mensagem central do cristianismo seja tão útil na ciência real (em vez da Hipótese Um não-humana) pode nos ajudar a entender por que tantos cristãos ajudaram a fundar a ciência moderna – e por que tantos agora a veem como sua vocação. Afinal, nas palavras (ligeiramente modificadas) de Jesus:
“Neste mundo, vocês terão problemas (científicos). Mas tenham coragem! Eu venci o mundo.”
Texto original: https://www.faraday.cam.ac.uk/churches/church-resources/posts/real-science-untimely-deaths-the-necessity-of-hope-and-struggles-with-tin-openers/
David Hutchings estudou Física com Gestão de Negócios na Universidade de York. Ele é professor de Física em Pocklington School, treina professores no Instituto de Física e fala regularmente em igrejas locais e em projetos de jovens cristãos. Ele mora em York com sua esposa Emma e suas filhas pequenas. Seu livro,”Let There Be Science: Why God Loves Science, and Science Needs God”, em co-autoria com o professor Tom McLeish, foi publicado pela Lion este ano.