WE NEED DISORDER 01 - Associação Brasileira de Cristãos na Ciência: ABC²

A narrativa da criação em Gênesis pode parecer, à primeira vista, uma história sobre Deus eliminando o caos e transformando-o em ordem. Mas não é assim que uma física enxerga. Em sua palestra na conferência da Christians in Science em Oxford, há algumas semanas, a Dra. Rhoda Hawkins explicou o porquê.

Hawkins estuda como eventos imprevisíveis em escala microscópica podem gerar algo muito previsível e útil em escalas maiores. Por exemplo, quando ampliamos uma imagem de “ruído branco”, vemos uma cor cinza relativamente uniforme; ou, ainda, o movimento aleatório das partículas de um gás resulta em uma temperatura média. Assim, enquanto no uso cotidiano a palavra aleatório muitas vezes sugere “sem propósito”, na ciência ela significa apenas que algo é imprevisível – e essa imprevisibilidade pode ser colocada em bom uso.

WE NEED DISORDER 02 - Associação Brasileira de Cristãos na Ciência: ABC²

Em um sistema fechado ou isolado, as coisas sempre tendem a se tornar mais desordenadas no geral (essa é a segunda lei da termodinâmica). Isso pode soar como má notícia para o universo, mas a ordem pode, na verdade, aumentar em certas regiões desse sistema se as condições forem adequadas. Por exemplo, os seres vivos mantêm sua organização ao ingerir energia na forma de alimento, o que lhes permite crescer e se desenvolver nas direções certas. No próprio trabalho de Rhoda, ela investiga como as células canalizam o movimento desordenado de certas moléculas para fazê-las formar longos filamentos que funcionam como um esqueleto, permitindo seu deslocamento.

Portanto, embora seja impossível prever cada evento individual no movimento aleatório de moléculas, é relativamente fácil prever o resultado coletivo. Os filamentos internos de uma célula podem apontar em várias direções, mas, juntos, ajudam a célula a se mover em uma direção definida. Uma molécula vibra de forma aleatória, mas esse movimento possibilita que uma reação química aconteça. Sem esse movimento inicial desordenado, nada ocorreria, porque as forças canalizadoras da célula não teriam com o que trabalhar.

Para os físicos, “o caos é o ventre da ordem” – e isso também pode ser visto nos relatos bíblicos da criação. Em Gênesis 1:1, a terra é descrita como “sem forma e vazia”, antes de Deus começar a criar ordem. Em Jó 38, Deus estabelece limites para o mar, trazendo ordem ao caos. Outro físico já destacou que, nesses textos, “a energia caótica não é negada, mas canalizada”. Sem o caos inicial, talvez essas coisas nem pudessem ter sido criadas.

Com essa visão do mundo, Rhoda percebe que se aproxima da ideia de que Deus pode não conhecer antecipadamente o resultado de cada minúsculo evento. Pode haver um propósito geral, mas os detalhes de como esse propósito é alcançado talvez não estejam previamente determinados. Ela também aceita que Deus pode ver a ordem geral em eventos nos quais nós ficamos presos aos detalhes e só enxergamos desordem. Nós queremos respostas claras, resultados que nos pareçam justos, mas isso nem sempre acontece. É claro que existe um tipo negativo de desordem, como

WE NEED DISORDER 03 - Associação Brasileira de Cristãos na Ciência: ABC²

 vemos quando mutações genéticas causam câncer – o que pode ser comparado ao pecado, que corrompe a ordem de Deus para o mundo e custou a vida de Jesus.

No fim das contas, a relação entre ordem e desordem parece um paradoxo. Algo que parece aleatório pode estar, na verdade, caminhando em uma direção frutífera. Atividades aparentemente sem propósito em pequena escala podem estar realizando algo com grande propósito. Para os ocidentais, isso pode ser difícil de aceitar, mas a visão de mundo hebraica parecia muito mais confortável com essas tensões e frequentemente reunia opostos: Deus é três pessoas, mas também um; Jesus é Deus e homem; quando sou fraco, então sou forte. Talvez, disse Rhoda, para compreender melhor essas realidades devamos nos inspirar também em filosofias orientais, como as tradições chinesas, que conectam forças opostas. No fim, a ordem pode produzir padrões incrivelmente belos. Essa beleza leva muitos cientistas à admiração, e, para físicos como Rhoda, também conduz à adoração Daquele que é, em última instância, o responsável por tudo.

 

 

WE NEED DISORDER 04 - Associação Brasileira de Cristãos na Ciência: ABC²Dra. Rhoda Hawkins é professora do Departamento de Física e Astronomia da Universidade de Sheffield e professora visitante no African Institute for Mathematical Sciences. Sua pesquisa envolve o uso da física teórica para lançar luz sobre problemas da biologia, incluindo movimento e polarização celular, citoesqueleto e alosteria proteica. Formou-se em Física na Universidade de Oxford e fez doutorado no grupo de Polímeros e Fluidos Complexos da Universidade de Leeds. Realizou pesquisa de pós-doutorado no FOM Institute for Atomic and Molecular Physics em Amsterdã, no Instituto Curie e na Universidade Pierre e Marie Curie em Paris, além da Universidade de Bristol. Também foi pesquisadora visitante e professora no African Institute for Mathematical Sciences na Cidade do Cabo. Rhoda é corredora de montanha, integra o comitê da Christians in Science e é membro da Igreja St Timothy, em Sheffield.

 

 

 

FROG ARTICLE 7 - Associação Brasileira de Cristãos na Ciência: ABC²

Ruth Bancewicz é pesquisadora sênior do Faraday Institute for Science and Religion, onde trabalha na promoção da interação positiva entre ciência e fé.

 

 

 

 

 

 

 

TEXTO ORIGINAL: https://www.faraday.cam.ac.uk/churches/church-resources/posts/why-we-need-disorder-a-physicists-perspective-on-the-living-world/

Projeto: The Wonders of The Living World
The Faraday Institute

 

 

Compartilhe a ABC²