Quando eu tinha três anos, derrubei um balde cheio de girinos no chão do quintal. Lembro-me muito bem desse episódio, o que indica que deve ter sido relativamente marcante. Tudo aconteceu no jardim dos fundos da casa que meus pais alugaram enquanto procuravam um lar definitivo na região de Manchester. Havíamos acabado de nos mudar da Escócia, deixando para trás uma casa da qual já não me recordo, mas que tinha um riacho no fundo do terreno.
Mudamos para o sul na primavera, por isso os girinos que acabei espalhando deviam ter sido recolhidos para nos ensinar de onde vêm os sapos – já que não podíamos mais vê-los todos os dias no riacho. Mas a curiosidade de uma criança pequena não conhece limites. O que há no balde? Não, o que há realmente lá dentro? Ou talvez eu estivesse apenas “ajudando”, tentando levá-lo para outro lugar. Houve um grande respingo, e acho que levei uma bronca rápida. Foi um pouco triste, porque não me lembro de ter visto aqueles girinos de novo, e provavelmente precisei esperar mais um ano para aprender sobre metamorfose.
Eu podia até ser ótima em destruir coisas quando criança (minha família provavelmente diria que ainda sou), mas eu adorava aqueles momentos em que podia observar de perto os seres vivos e ver seu crescimento e desenvolvimento. Uma das fotos premiadas no British Wildlife Photography Awards do ano passado mostrava um close de alguns girinos. A imagem de Jeanette Sakel confunde o olhar com bolhas na superfície da água. Os animais estão tão juntos e salpicados que quase parecem um punhado de algas. Mas, de repente, distinguimos os corpos, os olhos e os rabos grossos e percebemos que são, de fato, um aglomerado de organismos vivos. Mas como é que eles se transformam em sapos?
Dentro do cérebro do girino existem dois grupos de células, cada um produzindo um coquetel diferente de hormônios. Um grupo inibe a metamorfose; o outro a promove. No início, os hormônios inibitórios predominam, mas quando chega a hora certa (ou seja, quando o desenvolvimento do animal, a quantidade de luz solar, a temperatura e a disponibilidade de alimento estão em níveis adequados), o outro grupo assume o controle e a metamorfose começa.
Antes que um girino possa virar sapo, grandes partes de seu intestino, glândulas salivares e músculos precisam morrer, assim como as guelras. As células desses tecidos estão programadas para se enrolar e se desintegrar, sendo engolidas por um tipo especializado de glóbulo branco. Suas novas pernas começam como pequenos sacos de células no corpo do girino, chamados “discos imaginais” (assim chamados porque dão origem à forma final do organismo). Outras mudanças incluem a posição dos olhos e da mandíbula. Um dos meus livros de biologia do desenvolvimento diz que “o sistema nervoso também é remodelado” – o que, suspeito, seja uma boa dose de eufemismo.
Os hormônios que ativam a metamorfose têm efeitos diferentes em tecidos distintos. Assim, o rabo regride, enquanto novos membros se formam e crescem. O segredo desse mecanismo é que cada hormônio se liga ao mesmo tipo de receptor na superfície da célula, mas no interior, diferentes tipos de células acionam cascatas distintas de genes.
Essas camadas de conhecimento tiram um pouco do mistério de como um girino se torna sapo. Minha curiosidade está um pouco mais satisfeita do que quando eu tinha quase três anos, mas ainda restam muitas perguntas. Como exatamente o sistema nervoso é remodelado? Como a luz desencadeia a produção dos hormônios? O que aconteceria se os girinos fossem mantidos no escuro? (Não estou sugerindo que alguém tente isso em casa!) Esses detalhes também revelam a engenhosidade do processo. A metamorfose é surpreendentemente comum no reino animal, mas também incrivelmente complexa. Como pode ser essa uma forma eficiente de crescer? Ou será que a eficiência não é o fator mais importante para um animal?
Os cientistas são, essencialmente, adultos que continuam muito conectados ao seu “eu” de dois anos de idade. Eles se recusam a parar de fazer perguntas, mesmo quando encontrar respostas é bem mais complicado do que abrir um livro-texto. Este site apresenta diversos cientistas que também são pessoas de fé, e suas crenças nessa área igualmente impulsionam suas perguntas. Eles creem que Deus criou o mundo (por meio de um processo que levou centenas de milhões de anos) e que o propósito das coisas criadas é dar-Lhe glória. Assim, os cristãos, mais do que ninguém, deveriam investigar o que acontece ao seu redor e fazer perguntas que respeitem a integridade e a complexidade do que encontram. Essa teologia básica da ciência sustenta muitos de nós na comunidade científica e é, ao menos em parte, o que nos mantém espiando dentro de baldes cheios de sapos – até que algum ignorante ou desastrado de dois anos venha e os derrube.
Ruth Bancewicz is a Senior Research Associate at The Faraday Institute for Science and Religion, where she works on the positive interaction between science and faith. After studying Genetics at Aberdeen University, she completed a PhD at Edinburgh University. She spent two years as a part-time postdoctoral researcher at the Wellcome Trust Centre for Cell Biology at Edinburgh University, while also working as the Development Officer for Christians in Science. Ruth arrived at The Faraday Institute in 2006, and is currently a trustee of Christians in Science.
TEXTO ORIGINAL: https://www.faraday.cam.ac.uk/churches/church-resources/posts/a-bucket-of-frogs-curiosity-wonder-and-the-theology-of-science/
Projeto: The Wonders of The Living World
The Faraday Institute